Prótese de Quadril ou Artroplastia de Quadril

A artroplastia total de quadril é o procedimento cirúrgico do quadril mais realizado e provavelmente o que mais traz satisfação ao paciente (1,2). Devido ao aumento da expectativa de vida da população, espera-se que a cirurgia de artroplastia se torne ainda mais frequente nas próximas décadas. Conforme um levantamento do IBGE, a população com 65 anos ou mais aumentará em pelo menos 3,7x até 2050 (3).

A cirurgia de reconstrução do quadril como conhecemos hoje iniciou por volta de 1800, embora existam relatos anteriores propondo os mais diversos tratamentos. Schmaltz em 1817 e White em 1821 relataram casos de ressecção artroplástica do quadril para o tratamento de tuberculose em crianças (4). A técnica também é conhecida como cirurgia de Girdlestone, que relatou o procedimento em detalhes em 1943 (5). Posteriormente diversos autores sugeriram a substituição da artroplastia resseccional simples pela interposicional. A proposta agora era interpor substâncias entre as superfícies ressecadas, podendo estas serem cápsula articular, músculo, tecido adiposo, fáscia lata e pele (4). Como a nova técnica não produzia resultados duradouros, Smith-Petersen na década de 1940 desenvolveu a artroplastia interposicional do quadril com uma taça feita em Vitálio (liga fundida de cobalto-cromo-molibdênio) (4,6,7). A partir deste momento, diversos autores propuseram os mais variados tipos de endopróteses. Entretanto, foram os implantes de Thompson e de Austin-Moore que se tornaram reconhecidos (Fig. 1A) havendo variações ainda hoje (Fig. 1B). Neste meio-tempo, surgiram os implantes de metal sobre metal desenvolvidos por Urist (8), Ring (9,10) e McKee-Farrar (11) (Fig. 1C). Nesta época, observou-se resultados pouco satisfatórios, pois o atrito e o desgaste do material resultavam em uma incidência inaceitavelmente alta de afrouxamento e dor (4,7).

Apesar destes implantes terem proporcionado uma melhora da função, nenhuma destas hemiartroplastias promoveu o alívio da dor por tempo prolongado, buscado pelos pacientes com articulações artrósicas. Então, desenvolveu-se as substituições articulares totais de quadril (4,7). Em 1958, Sir John Charnley iniciou o desenvolvimento de uma prótese que consistia em uma haste com cabeça femoral metálica que se articulava com um componente acetabular de polietileno, ambos fixados com cimento ósseo de polimetilmetacrilato (12,13,14) (Fig. 1D). Os aperfeiçoamentos do modelo, dos materiais e das técnicas cirúrgicas evoluíram muito até os dias de hoje, porém muitos dos conceitos básicos de Charnley continuam válidos (4,7).

Figura 1. História da artroplastia. (A) Prótese de Thompson e (B) uma variação com cabeça intercambiável; (C) prótese de McKee-Farrar; (D) prótese total de Charnley;

Na década de 70 observou-se que os problemas associados com a artroplastia total de quadril cimentada estavam relacionados com o afrouxamento asséptico dos componentes. Iniciou-se uma corrida pela mudança do design dos componentes que pudessem propiciar resultados mais duradouros. Charnley em 1975 estudou histologicamente a membrana da interface cimento-osso e observou que esta possuía um grande número de células gigantes do tipo corpo estranho e histiócitos com acrílico no interior de seu citoplasma (14). Goldring et al. em 1983 observaram que nesta mesma membrana, havia um grande número de macrófagos e de células semelhantes às da membrana sinovial da artrite reumatóide. Estas membranas apresentam uma grande capacidade de produzir prostaglandinas E2 e colagenases protagonistas da gênese de lise óssea. O autor considerou o cimento como causador definitivo do afrouxamento e denominou a “doença do cimento” (15).

Nesta época iniciou-se a procura de uma fixação mais adequada e duradoura sem o uso de metilmetacrilato. Apesar de Sivash (16), Ring (9,10) e Mittelmeier (17) já utilizarem as próteses sem cimento, a idéia de “fixação biológica”, em que a fixação da prótese é obtida pelo crescimento ósseo para o interior das porosidades dos componentes metálicos (4,7), iniciou-se quando Bobyn et al., em 1980, relacionaram o tamanho das porosidades com a capacidade óssea de crescimento (18). O crescimento ósseo e a fixação ocorrem para uma faixa de porosidade entre 50 e 400 micrometros, com máxima eficácia entre 100 a 400 micrometros. Para outros tamanhos, ocorre crescimento de tecido fibroso. O revestimento poroso pode ser obtido por malhas, porosidades do próprio material, pó metálico incrustado ou hidroxiapatita. A era das próteses não-cimentadas estava surgindo (4,7,19).

Exemplos de artroplastia cimentada e não-cimentada podem ser vistos na Fig. 2, através das radiografias. A figura ainda mostra exemplos radiográficos de artroplastias híbrida (haste femoral cimentada e componente acetabular não-cimentado) e híbrida-reversa (haste femoral não-cimentada e componente acetabular cimentado). O sucesso da artroplastia total de quadril depende basicamente de três fatores críticos: escolha do paciente, do implante e da técnica cirúrgica. Provavelmente, o determinante isolado mais importante seja a escolha apropriada do paciente. A escolha de um paciente inadequado pode comprometer o design mais avançado ou mesmo o cirurgião mais experiente (1,2,7).

Referências

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Dr. Leonardo Boschin

Ortopedista Especialista em
Quadril em Porto Alegre

Nascido no Rio de Janeiro (RJ) em 1974, foi aprovado em 1° lugar para graduação em Medicina pela Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre (1992 -1997). Residência médica na Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de Porto Alegre (1998-2000). Especialização em Cirurgia do Quadril, Joelho e Tumores Ósseos pela Universidade Federal do Paraná (2001). Especialização em “Adult Reconstruction and Total Joints” pela University of Tennessee – USA (2001-2002).

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